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MORRA, MAS NÃO CORRA! (2018)

“Morra, mas não corra”- gritava o pai à criança, de mãos dadas, ao atravessar a avenida mais movimentada.

A figura da bailarina se impôs como aquela que supera as dores para viver da leveza. Ela sempre triunfa. Este fato influenciou a pesquisa da bailarina para a criação desta obra, que coloca em discussão as questões de sucesso/fracasso, heroísmo e superação em uma carreira profissional.

Esta performance em dança desenvolvida pela bailarina Priscila Patta reflete criticamente sobre os modos tradicionais de se pensar e produzir dança no Brasil. Para tanto, ela trás o humor ácido para a cena e faz piada consigo mesma ao contar suas histórias (reais) de fracasso, que foram exatamente as que construíram sua carreira de dança. Ao contrário da expectativa heróica e perfeita que a dança propõe, do mundo desejado das grandes companhias, premiações etc, tudo o que a bailarina-intérprete-criadora planejou deu errado. Mas ela segue o seu fazer dancístico, insistindo dia trás outro na busca de ser algo perto da bailarina que ela idealizou. Quanto mais pensa, mais se distancia deste ideal.

A proposta nasceu na 1ª Temporada para Solos de Dança, produzida pela REDE SOLA DE DANÇA, entre julho e agosto de 2018, pelo edital de ocupação da Funarte/MG. Priscila Patta, uma das artistas da temporada decidiu experimentar um trabalho novo, onde lhe interessava falar sobre feminismo, arte no Brasil atual, eleições, sobrevivência. Imediatamente o título veio: Morra, mas não corra. Fruto de uma brincadeira que seu pai fazia quando as filhas eram criança ao atravessar a Avenida Afonso Pena, em Belo Horizonte. O adulto lhes segurava firme as mãos, e dizia convicto: “filha, morra, mas não corra”. Esta brincadeira sempre pareceu absurdamente engraçada para a bailarina, que define o próprio pai (primeira referência de instrução de vida) como “o pior exemplo de vida”, pois o pai sempre incentivou todas as brincadeiras, comprou cigarros e tomou porres com a filha ao longo de sua vida.

Acontece que a primeira noite de experimentações, embora tenha agradado a plateia, deixou a criadora ainda insatisfeita. Decide que no segundo dia de apresentação não iria necessariamente dançar, mas iria contar casos sobre os seus fracassos na dança. A tentativa de se construir uma obra-prima, algo que seja genial, arrebatador – comum no universo da dança, devido às aspirações profissionais -, aprisiona a criação, e a torna medíocre na maioria das vezes.  Talvez, a potência esteja exatamente em desnudar-se. Assim, nasceu a ideia de me sentar em uma cadeira e conversar por 15 minutos.

O resultado foi, sem dúvidas, mais próximo àquilo que eu desejava comunicar. Embora se esteja falando de dança, o desenvolvimento da obra abre para problematizações outras, que encontram diálogos em questões do cotidiano que abarcam a todos nós. Como as questões político-partidárias, sociais, morais, por exemplo. Neste caso, ninguém espera que uma artista da dança vá escancarar os seus fracassos, insucessos, e frustrações de maneira tão naturalizada. E as histórias, reais que são, encontram ressonância nas diferentes pessoas da plateia; umas porque são da área e vivem as mesmas circunstâncias, outras porque encontram nos textos metáforas para os seus insucessos.

Morra, mas não corra, é um protesto contra toda a tirania que também há na dança... e mais.

Esse solo circulou por Belo Horizonte e Rio de Janeiro

Concepção e performance - PRISCILA PATTA

Projeto de luz - GERALDO OTAVIANO

Duração - 15min

Foto - Pablo Bernardo

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